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quarta-feira, 26 de abril de 2017

“Sou um PM injustiçado”, canta em música policial preso acusado da Chacina da Messejana

O soldado Samuel Araújo de Aquino, preso há oito meses, foi denunciado por homicídio, mas teve acusação reclassificada para prevaricação.

Protestos em frente ao Fórum Clóvis Beviláqua, abraço coletivo à sede do 5º Batalhão da Polícia Militar (5º BPM), que já havia recebido um acampamento em sua frente. As denúncias de injustiça no processo que apura a “Chacina da Messejana” ganharam agora mais uma forma de manifestação em uma música que passou a ser compartilhada nas redes sociais da internet.

No áudio, o soldado Samuel Araújo de Aquino, de 27 anos, ao som de um violão, canta a inocência. Ele é um dos 44 policiais militares presos desde setembro de 2016 acusados de participação na chacina de 11 pessoas na região da Grande Messejana. Desses, oito estão aguardando julgamento em liberdade.

“Me prenderam sem julgamento / Me prenderam sem ser culpado / Como fere ser injustiçado / Não é assim que se faz justiça / Estão acabando com a minha vida”, afirma ele. Confira abaixo a canção na íntegra:

Para o presidente da Associação de Profissionais da Segurança (APS), Reginauro Sousa, a música reflete parte do sentimento de injustiça nutrido pelos policiais presos.

“Mas nenhuma música ou peça de teatro — talvez um filme — é capaz de exprimir o sentimento de ser preso sendo inocente, afastado da família sabendo que estava cumprindo a missão de policial”, afirma. “Muitos estavam a mando do Estado. Nada no mundo repara isso”.

Os versos ganham novo significado com a expectativa pela qual possa Samuel de ganhar liberdade. Após acusação inicial de homicídio, o Ministério Público emitiu pedido de desclassificação para que o soldado Samuel respondesse apenas por prevaricação, o que o levaria a ser julgado pela Justiça Militar.

Nos próximos dias, deve sair a sentença de pronúncia do colegiado que julga o caso. Para o advogado da APS Cícero Roberto Bezerra de Lima, que representa Samuel, a desclassificação pedida pelo MP já é uma vitória, mas a defesa ainda busca a absolvição completa do soldado.

Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), Samuel, que estava de serviço na madrugada em que a chacina foi realizada, no dia 12 de novembro de 2015, passou pelo local em que duas das vítimas foram assassinadas, mas não prestou socorro. Ele estava na viatura 1.302 junto com os policiais Fábio Oliveira dos Santos e Kelvin Kessel Bandeira de Paula.

Por volta da 1 hora, câmeras de vigilância teriam flagrado a viatura passando pelo cruzamento da Avenida Odilon Guimarães com a Rua Elza Leite Albuquerque, onde foram assassinados Marcelo da Silva Mendes e Patrício João Pinho Leite. Nenhuma outra viatura foi localizada no local.

Os policiais passaram por vários veículos estacionados, que estavam com os pisca alertas ligados, ainda conforme o MP. Em áudios aos quais a investigação teve acesso, participantes da chacina diziam que era este o sinal que indicava pertencimento ao grupo.

“Senão fosse, pois, essa sinalização previamente acertada entre os PMs, seria, a rigor, uma situação, suspeita que merecia ter sido averiguada pelos policiais”, consta na denúncia do MP.

O MP ainda afirma que a Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops) já havia repassado a ocorrência do duplo assassinato aos policiais. A investigação policial ainda apontou, com base no GPS do veículo, que a viatura em que Samuel estava ficou três minutos parada nas proximidades de um posto localizado a cerca de 250 metros do local dos crimes, onde estavam estacionados o carros de policiais que estariam participando da chacina.

“A Polícia chegou na esquina e voltou”, disse um cidadão que ligava à Ciops pedindo que a Polícia fosse à região atender ao duplo homicídio, divulgou o MP.

As acusações são rechaçadas pela defesa do soldado, nos memoriais apresentado ao júri, documento ao qual Tribuna do Ceará teve acesso. No documento, a defesa afirma que o auditor do equipamento de GPS, arrolado como testemunha de acusação, diz não ser possível identificar a viatura que se depara com o comboio, conforme flagrado pelo vídeo.

Em depoimento na fase de pronúncia do processo, o sargento Lucinásio Lima de Melo alenta a possibilidade de essa viatura ter o posicionamento perdido pelo equipamento de localização. O advogado Cícero Roberto acredita que a delegada que presidia o inquérito deduziu tratar-se da viatura 1.302 pela latitudes e longitudes informadas no GPS informar que o veículo esteve na região entre 1 e 1h06min, a partir de fotografias tiradas em três pontos, chamados de 21, 22 e 23 — cada um separado por três minutos de distância. Seria esse o período identificado pela investigação como a pausa feita pela viatura diante do comboio dos criminosos.

Conforme o sargento Lucinásio Lima de Melo, não é possível afirmar que a viatura esteve parada nesse momento. A defesa ainda pontua que os homicídios e a passagem dos carros nos quais estariam os assassinos na avenida Odilon Guimarães acontecem entre 0h30min e 0h45min. Já com relação à inércia da Polícia relatada por um morador, a defesa afirma que as viaturas estavam em outro endereço no horário da ligação. “Acredito que a delegada se precipitou”, afirma Cícero Roberto. Ele questiona ainda a falta de perícia no sistema de localização e de que não foi definitivamente provado de que os assassinos usaram os pisca alertas como sinal.

O deputado estadual Capitão Wagner defendeu as mesmas teses em plenário do dia 22 de março último. À época, a delegada Adriana Câmara, responsável pelo inquérito, não quis comentar as declarações. Já a Controladoria-Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD), em nota, afirmou que investigação da Delegacia de Assuntos Internos (DAI) respeitou os devidos trâmites processuais.

Cícero Roberto também nega que as câmeras tenham flagrado a viatura recebendo sinal dos carros em que estavam os assassinados e que sequer foi provado de que havia um sinal comum indicando a participação na operação. Ele ainda afirma que ele pretende pedir indenização por danos morais pela prisão indevida. A delegada não deve ser processada, mas sim o Estado, que pode implicá-la pela investigação mal feita, afirma o advogado.

De acordo com a investigação da Controladoria-Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD), mais de 100 policiais militares praticaram os crimes como uma retaliação à morte do soldado Valtemberg Charles Serpa, morto em um latrocínio na tarde do dia 11. Sem encontrar nenhum dos suspeitos do crime, os policiais passaram a atirar contra pessoas aleatórias que estavam na rua, sustenta o MP.

A operação ilegal teria sido marcada por meio de redes sociais — comunicação que nenhum dos 44 PMs presos teve parte, segundo o advgado Régio Menezes, também da APS. “Fizeram a quebra do sigilo telefônicos dos policiais, mas nenhum dos presos estava nesse grupo”, afirma ele. “Quem vai fazer chacina, não vai em viatura que é conectada à Ciops”.

Segundo o advogado, os assassinos fizeram “chamados fantasmas” para distrair a Polícia. “A imensa parte da acusação é baseada em conjecturas, o que é incompatível com o Processo Penal. Quem foi preso tem maior interesse em encontrar os verdadeiros assassinos”.

Fonte: Tribuna do Ceará

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