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quarta-feira, 14 de março de 2018

O Ceará magricela entre chacinas e o projeto de poder

A agenda dos nossos governantes precisa mudar. A forma de fazer política também. Urgente.
Imagino o quanto Camilo Santana (PT) está pessoalmente consternado e pressionado pela barbárie que assola o Ceará. Só imagino. Não converso com o governador há algum tempo. Porém, diante de acontecimentos tão avassaladores, esperávamos (continuamos esperando) muito mais da autoridade responsável pela segurança pública.

Camilo parece ter entrado naquela fase bem peculiar aos governantes que já não conseguem mais dar uma resposta à altura do problema posto. O mote é jogar a batata em brasa no colo do Governo Federal. Ou seja, nacionalizar o problema. Mesmo que em alguns pontos o argumento tenha sentido, esta é uma saída velha e batida.

Fustigado por um jornalista após a primeira chacina, Camilo reagiu com o fígado. Descontrolado, gritou que o Estado mantinha o controle da situação. Não mantinha. Tanto que se seguiram mais duas chacinas e a multiplicação de assassinatos. Alguns filmados. Os vídeos tornaram-se líderes de audiência nas redes sociais. Na verdade, o Governo não controla nem sequer alguns dos maiores presídios.

Os homicidas serão descobertos e presos. Não tenho a menor dúvida. São uns celerados. Este último sujeito preso pelos investigadores, levou o carro usado no crime do Benfica para a garagem do prédio onde mora. Deixou os cartuchos usados dentro do automóvel. Portava armas e drogas. Vê-se logo que não é gente de raciocínio privilegiado.

Prisões e mortes de bandidos aos borbotões não estão diminuindo a quantidade de assassinatos e assassinos nas ruas, como era natural ocorrer. Parece haver no Ceará um clima que estimula mais e mais crimes. Vida e morte banalizadas por um exército que não se importa se o destino de cada um desses soldados está a sete palmos do solo ou na penitenciária.

Essa banalidade, diga-se, vem há anos sendo cultivada e adubada pela programação das nossas TVs que, na hora das refeições dos cearenses, se especializou em mostrar “presuntos” rodeados de sangue, crianças, adolescentes e toda a vizinhança. Um espetáculo macabro com a omissão, por exemplo, do glorioso Ministério Público e o aplauso de muitos políticos.

O fato é que Camilo precisa fazer muito mais. Foram três chacinas e centenas de mortos só em 2018. Precisa fazer mais, porém não apenas em ações policiais. Um líder de referência, no mínimo, teria visitado familiares de inocentes chacinados. Há uma inexplicável e cômoda distância da dura realidade, inclusive em relação aos muitos policiais que tombam na batalha cotidiana da cidade.

No púlpito público, a última série de assassinatos, no Benfica, mereceu apenas um comentário burocrático de Camilo em sua página no Facebook e uma rápida passagem pela delegacia de homicídios. As baterias do governador mostram-se bem mais carregadas em seus périplos políticos pelo Interior. Campanha pura. Algum gênio do marketing político até inventou uma espécie de programa de auditório para as aparições de Camilo.

Um palanque é montado, ato festivo, música. O ato é comandado pelo governador, que assina, quase sempre de camisa azul (vai ser a da campanha?) uma ordem de serviço, um anúncio de investimentos ou o lançamento de um projeto. A seguir, um a um, os políticos presentes são chamados para assinar o documento que, obviamente, é fake. Ao fim, todos de mãos dadas confraternizam em uma chuva de papel colorido.

Soa estranho assistir a tal cena enquanto nos deparamos com a montanha de mortos e com o pavor generalizado da população.

Sim, inventaram o comício da Ordem de Serviço. No mínimo, dois atos desses por semana. Em grande parte, quem era oposição, hoje está nessa festa. Há uma especialidade política no Ceará que vingou na última década: cooptar opositores. Não importa se são alhos ou bugalhos.

Ofertas de obras e ordens de serviços são feitas aos borbotões. Quem não aderir ao Governo, terá seu colégio eleitoral invadido sem dó nem piedade. O projeto é inviabilizar qualquer respiro oposicionista. Nada mais autoritário. Também do ponto de vista da democracia, nada mais medíocre. O projeto é manter o poder. A meta é única. Já sabemos muito bem no que isso deu no Brasil.

Para tanto, o Governo mantém uma máquina inchada, cara e de baixíssima eficiência. Em grande parte, é o custo, digamos, político. É o custo para sustentar os apoiadores que se amontoam nas tetas dessa vaca magricela chamada Ceará. É o custo de distribuir cargos para os partidos. É o custo de manter gente incapaz na máquina comandando pequenos, médios e grandes orçamentos em diversas áreas. Claro, sempre há as devidas e honrosas exceções.

Tudo tem a ver com segurança pública. A rua Madre Teresa, onde ocorreu a chacina dos 14, diz muito. Terra batida, esgoto a céu aberto, sem calçadas, escura. Sim, uma entre milhares de ruas de Fortaleza onde as pessoas nem sequer têm serviço de esgoto.

A agenda dos nossos governantes precisa mudar. A forma de fazer política também. Urgente.

Por Fábio Campos

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