Lucas Ramalho e Tatiana Viana perderam a filha Beatriz aos nove meses da gestação da mulher, em março de 2019. Desde então, os dois têm se dedicado ao grupo 'Da dor ao amor', que acolhe e orienta pais que passaram pela perda gestacional.
Neste domingo (15), o grupo realiza um encontro aderindo à Campanha International Wave of Light (Onda de Luz, em português), que marca o Dia da Sensibilização à Perda Gestacional, definida como a 'remoção do embrião ou do feto antes de atingir a viabilidade, podendo ser um evento único isolado ou recorrente'.
No Ceará, Nos dados mais recentes do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM/GT) Vigilância do Óbito, foram contabilizados em 2022, até o dia 3 de setembro, 831 óbitos gestacionais, sendo a maior parte (217) entre as semanas 32 e 36 da gravidez. As informações são da Secretaria da Saúde.
'A gente passou pelo pior momento de nossas vidas, que foi saber do falecimento da Beatriz. Tivemos que fazer um parto de emergência, tirar ela sem vida do ventre da minha esposa. Assim foi feito', contou Lucas ao g1.
O 'pior momento de suas vidas' acabou sendo amortecido pela oportunidade de se despedir da criança. Lucas e Tatiana pegaram a menina nos braços e puderam conhecer o rostinho da filha.
'Digo que foi um momento bem abençoado. Senti realmente a presença de Deus naquele momento. Foi miraculoso mesmo', relembrou emocionado.
Depois que se viram na situação, mergulharam de cabeça na temática.
'Sentimos um desamparo de acolhimento em relação a com quem a gente pudesse conversar melhor. Sempre tivemos uma roda de apoio forte com a família, mas sentimos uma lacuna', disse Ramalho.
A ideia de reunir pessoas que passaram por experiências parecidas nasceu efetivamente em agosto de 2019. Desde então, a 'missão' que Beatriz deixou para os pais tem sido a de ressignificar a perda gestacional.
'A gente também acolhe pai, mãe e familiares que passaram por dores similares. Nenhuma dor é igual a outra, mas temos pontos de similaridade onde a gente consegue ter uma noção mais empática'.
Lucas e Tatiana foram espalhando a palavra aos amigos, que levaram para conhecidos e outras pessoas. O grupo foi tomando forma nas redes sociais, em grupos de WhatsApp e Instagram e, hoje, fazem encontros mensais. Durante a pandemia, também se reuniram de forma online.
'É um momento onde a gente troca experiências. Em outubro, a gente tem o dia da conscientização. Nem eu e nem minha esposa somos psicólogos, embora a gente recomende bastante, mas é um grupo onde trocamos experiências, acolhemos e somos acolhidos', explicou Lucas.
Como falar sobre perda gestacional?
De acordo com Lucas, ao longo da vivência com o grupo, ele foi percebendo que não há uma fórmula para tratar o assunto com pais que passaram pela perda.
O mais importante, segundo ele, é ter cuidado com as palavras. É preciso evitar frases como 'foi melhor assim, porque não sabia se teria alguma doença' - algo que ele e a esposa ouviram bastante após falecimento da Beatriz - e expressões como 'Deus sabe o que é melhor', aplicadas em contextos religiosos.
'A gente recomenda falar que sente muito, que quer conversar, deixar a pessoa se abrir, estar disponível para ouvir. Deixe um abraço, um beijo e diga que está ali para conversar. Outra forma de machucar é não dar abertura para que as pessoas falem', completou Lucas.
Hoje, o casal tem o pequeno Rodrigo, que nasceu em 2021.
'A importância de falar sobre esse assunto é ,principalmente, em relação ao tabu. As pessoas não sabem lidar com a morte, não sabem lidar com a perda gestacional. Tem a parte da saúde mental dos pais, de terem um lugar para ressignificar o luto'.
Tema ainda é tabu
A perda gestacional é definida como a 'remoção do embrião ou do feto antes de atingir a viabilidade, podendo ser um evento único isolado ou recorrente', conforme a Secretaria da Saúde do Ceará.
Uma perda gestacional da 22ª até a 36ª semana é chamada pelos médicos de parto prematuro de um natimorto. Da 36ª semana em diante, se o bebê morre no útero materno, diz-se que houve uma perda gestacional tardia.
O tema, ainda delicado, vai ganhando espaço aos poucos. No domingo, o grupo 'Da dor ao amor' estarão na Praça Luiza Távora, em Fortaleza.
A Campanha International Wave of Light é um movimento global. No dia, às 19h, os membros são convidados a, simbolicamente, acender uma vela em memória dos pequenos que se foram.
'A gente vai ter uma programação especial com concentração, momento com música e balões', disse Lucas, que está à frente da organização.
G1 CE
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