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sábado, 19 de abril de 2014

Em vídeo, jornalista dinamarquês fala que teve medo de morrer em Fortaleza

Através do Skype, Mikkel Jensen revela ao Tribuna do Ceará os detalhes da sua estada no Brasil; Falou do fim do sonho de cobrir a Copa e reafirmou não ter coragem de voltar

“É um pouco estranho. Algumas pessoas acham que eu não existo”, desabafa ao Tribuna do Ceará o jornalista dinamarquês Mikkel Keldorf Jensen, que se decepcionou com a insegurança em Fortaleza e desistiu de cobrir a Copa do Mundo no Brasil.
A entrevista exclusiva foi realizada na manhã desta quinta-feira (17) pelo Skype durante 30 minutos. Logo no início, Mikkel Keldorf pediu apenas para desligar a webcam. “Não quero que gravem, tenho um vídeo que vou publicar na internet para os brasileiros verem que não sou fake[falso]”. E, somente assim, a conversa reveladora começou. Trabalho, onde apurou as informações, medo de morrer, diferença entre Fortaleza e Dinamarca e o fim do sonho de cobrir o megaevento esportivo foram os temas tratados na entrevista.
O dinamarquês reafirmou que saiu do Brasil e desistiu do sonho após se deparar com a insegurança em Fortaleza, cidade-sede onde registrou, por duas semanas, conversas com crianças de rua e com responsáveis por Organizações Não Governamentais (ONGs). “Tive medo de fazer contato com oficiais e com policiais. Muita gente falou para mim que era perigoso me identificar”, disse.
Mikkel confirmou não ter coragem de voltar à cidade-sede mais perigosa do mundo tão cedo. Após ver a situação de desigualdade, contou ser “difícil voltar, ficar na praia, tomando caipirinha todo o dia e ficar feliz todo o tempo, quando você abre os olhos e vê a realidade do Brasil”.
TRABALHO
Trabalhei em uma estação de televisão na Dinamarca, que chama TV2, como repórter de esporte. Depois estudei meio ano na PUC do Rio de Janeiro, no Brasil, quando estudei história, português e documentário. Depois fui para Shanghai, na China, e fiz alguns vídeos.
Em 2013, em setembro, voltei para o Brasil para fazer um documentário sobre a Copa do Mundo. Eu não estava aí para fazer notícias para televisão ou jornais, estava para fazer o documentário. Tenho muito material e gravei com muitas pessoas. Muita gente diz que eu não publiquei nada, mas quando se está fazendo documentário, você vai publicar o documentário e não publicar notícias.
É um pouco estranho. Algumas pessoas acham que eu não existo. É óbvio que eu existo.Quanto ao meu Facebook [surgiu a informação de que teria criado o perfil em 2013], eu criei uma conta para mim em 2007. Quem disse que eu fiz em 2013? Tenho várias publicações em anos anteriores, inclusive. Esse jornalista que disse isso está famoso no Brasil?
ONDE APUROU AS INFORMAÇÕES
Passei duas semanas em Fortaleza. Conversei com muitas crianças de ruas. Falei com várias organizações sociais. Encontrei essas crianças na Avenida Beira-Mar, mas também fui para outros bairros da cidade para ver como pessoas mais pobres estão vivendo. Fui para vários lugares, principalmente bairros de periferias. Não lembro dos nomes, fui em vários. Soube dos assassinatos de crianças através das pessoas que trabalham com essas crianças. Elas acham que existem grupos de extermínio.

MEDO DE MORRER

Tive medo de morrer, com certeza, porque é muito perigoso. Fortaleza é a cidade-sede mais perigosa do mundo, mas eu tive medo porque sou jornalista. Achei muito ruim, muita pobreza, tive medo de fazer contato com oficiais, com policiais. Muita gente falou para mim que era perigoso fazer isso, me identificar. Por isso estava um pouco difícil fazer meu trabalho como jornalista normal. Eu não acho que Fortaleza não é uma cidade normal, é a cidade-sede mais perigosa do mundo! É difícil ser jornalista aí. E, se você for gringo, acaba tendo muita atenção das pessoas, fica difícil de fazer uma coisa que as pessoas não percebam. Se eu estou com uma câmera, sou gringo e falo com crianças na rua, todo mundo sabe que eu sou jornalista. Por isso fiquei com medo.
Publiquei meu relato em dinamarquês no Facebook. Achei melhor publicar o relato em português só quando tivesse chegado na Dinamarca. Minha família ficou feliz por eu não ter publicado ainda estando no Brasil. Todo mundo sabe que está perigoso falar sobre isso.
Mas a minha chegada na Dinamarca foi um pouco estranha, porque quando eu fui embora de avião tinha uma estação de televisão que me entrevistou, perguntou porque eu estava saindo, foi muito estranho receber toda essa atenção e interesse. Fui para um programa aqui, onde falamos – durante 20 minutos – sobre o interesse dos brasileiros, sobre as notícias do Brasil, e também fizeram uma reportagem sobre todo mundo querer ouvir a história do Mikkel.

DINAMARCA X FORTALEZA

Dinamarca é muito mais tranquila do que Fortaleza. Não temos muita violência. Eu acho que a vida é muito fácil, se comparar à vida no Brasil. Eu acho que é difícil para as pessoas na Dinamarca entenderem que está perigoso fazer os trabalhos, porque aqui você pode falar sobre tudo, tem liberdade de imprensa. É mais difícil no Brasil. As pessoas da Dinamarca não conhecem isso, não entendem isso.
É um absurdo. Se você gosta de humanos, tem que saber que muitos estão morrendo, inclusive crianças. Não entendo porque as pessoas da Dinamarca não querem saber o que está acontecendo nos outros lugares do mundo. Queremos ficar no nosso lugar e não saber que em outros países tem problemas graves. Acho mais fácil para os dinamarqueses.
É muito difícil ver que a vida de uma criança de rua não tenha o mesmo valor do que uma que tem pai e mão muito rico. Na Dinamarca é diferente, na minha cabeça isso é diferente. Eu acho difícil ver essa desigualdade, todo mundo deveria ter os mesmos direitos, mas tem lugares no Brasil que não tem isso.

O SONHO ACABOU

Para mim, é muito perigoso voltar para Fortaleza, porque agora eu estou presente em muitas mídias e muitas pessoas não acreditam e nem gostam do meu trabalho. Foi triste ter que abandonar o sonho [cobrir a Copa do Mundo no Brasil], porque eu gosto do Brasil. Muito, muito, muito. Tenho muitos amigos. Mas quando eu descobri o que acontece, tive uma reação muito negativa. Quando vi que muitas pessoas ainda têm pensamento antigo, de desrespeito à vida humana, é difícil de voltar, ficar na praia, tomando caipirinha todo o dia e ficar feliz todo o tempo.Quando você abre os olhos e vê a realidade do Brasil, é difícil de voltar para ser um turista.

Fonte: Tribuna do Ceará

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