Os jovens se casaram com a permissão das duas famílias. De acordo com a lei brasileira, casamentos só são válidos entre pessoas que tenham no mínimo 16 anos. Assim, o casamento de Hyara não tem validade para a Justiça brasileira. No entanto, ele faz parte da cultura cigana, desde que consentido pelos familiares.
A diretora do Centro de Estudos e Discussões Romani, a cigana Maura Piemonte, explica que o casamento entre jovens não é, nos dias atuais, uma obrigatoriedade, mas sim uma questão de livre arbítrio.
“Não é que você promete antes. A gente conversa. Se o adolescente quiser casar, ele casa, mas nós não obrigamos. A partir dos 14 anos já é uma idade em que ela já está mocinha, e já pode casar, sim”, argumentou.
Roy Rogeres Fernandes, ativista cigano, reforça que a cultura cigana vem passando por mudanças para tentar permitir que as mulheres tenham maior poder de escolha sobre o próprio futuro.
“Hoje a gente pode dizer que essas tradições vêm tendo algumas transformações, algumas modificações para que as comunidades e as mulheres, especialmente, possam ter as suas decisões”, explicou.
O bispo da igreja católica de Eunápolis, Dom José Edson de Oliveira, realizou a cerimônia de casamento de Hyara e o marido, cuja festa durou três dias. Ele não condenou a prática e disse entender que se trata de um costume dos ciganos.
“A gente vê hoje a crítica da sociedade porque a sociedade faz o julgamento a partir da sua ótica. (...) Os pais têm a preocupação que a sua filha possa ser fiel à sua tradição”, destacou.
O Crime
Hyara Flor foi morta com um tiro na casa onde vivia com o marido no início da tarde do dia 6 de julho. Imagens obtidas pelo Fantástico mostram que um dos irmãos mais novos do adolescente saiu da casa chamando pelo pai. O pai e o tio do jovem entraram na casa correndo. E instantes depois, o carro de um vizinho, também cigano, entra na casa e sai para o hospital. Hyara, no entanto, morreu pouco depois. E três minutos depois, um vizinho vai de carro até a casa, busca a vítima e tenta levá-la para o hospital. Ela morreu pouco tempo depois.
O tio do jovem é a única testemunha que disse, em depoimento, ter visto o jovem com a arma na mão, e afirmou ainda ter visto ela no chão sangrando pelo nariz e boca. Segundo a polícia, a arma não era registrada e não se sabe quem era o dono dela. O laudo da perícia diz que o tiro foi feito a no máximo 25 centímetros de distância, e a bala ficou alojada em uma vértebra cervical no pescoço da jovem.
A família de Hyara, por sua vez, acredita que o crime foi motivado por vingança: o pai do jovem teria mandado ele matar a esposa por causa de um relacionamento extraconjugal da mãe do adolescente com um tio da jovem.
Já a família do marido de Hyara aparece nas imagens entrando em um carro branco e saindo em alta velocidade. A polícia rastreou o veículo e viu que eles foram até cidades do Espírito Santo, e depois desapareceram. Ainda não se sabe se o tiro foi intencional ou não. Mesmo assim, a polícia pediu a prisão do jovem.
“Para a gente, com olhares da nossa cultura, a gente não vê isso como motivação. Mas a cultura cigana é diferente, eles têm outras tradições, eles encontram outras motivações diferentes das nossas. Então não é impossível que isso tenha acontecido”, explica Moisés Damasceno, coordenador regional da Polícia Civil da Bahia.
G1